Ela subiu a colina. Pôde ver o Sol se pondo, à esquerda, porém sem parar de caminhar. Depois de algum tempo, não havia mais como seguir. Ela se viu diante de um abismo. Hesitou uns dez minutos, e finalmente deu três passos, lançando-se assim naquele profundo abismo.
Enquanto caía, Ela pensou em muitas coisas. Pensou em que tipo de pessoa faria exatamente aquilo que o seu inimigo mortal recomendara, pensou em quem seria o seu inimigo mortal, pensou em por que estaria vendo pontos luminosos e pensou em por que aquela queda estava sendo tão longa.
Antes que pudesse concluir qualquer pensamento, sentiu um impacto. Um impacto, mas não uma dor. Então sentiu uma disposição sobrecomum, como se tivesse acordado de um sono de anos.
- Bom dia, minha querida.
Ela abriu os olhos e sorriu ao ver o garoto pálido. Olhou em todas as direções para entender o que se passava, porém só ficou mais confusa.
- Não se preocupe, estarei aqui para responder às suas perguntas. - disse o garoto.
- Nem que seja com o silêncio. - Ela replicou, um tanto sarcástica.
- Exatamente.
- Aonde estamos?
- Você está no Reino de Alecrim.
- Alecrim? Alecrim lembra alegria. - Ela disse levantando-se do chão forrado com lençóis branquíssimos.
- Há muito tempo, o dono do Circo de Alecrim, o Palhaço, enlouqueceu. Ele construiu um circo gigante, nunca visto antes. Um circo, segundo ele, mágico. Nele só podem entrar artistas, e o mais importante, artistas felizes. É onde você está agora.
Ela olhou a sua volta, e então entendeu porque estava amplamente cercada por uma lona colorida.
- Enlouqueceu?! Não, o Palhaço teve uma grande idéia.
Pôs-se a andar pelo reino, observando cada artista. Era tudo tão feliz e harmonioso, que Ela sentiu náuseas.
- Escutem, qual é o defeito deste lugar? - Ela ousou perguntar em voz alta.
- Aqui não há imperfeição alguma, minha cara. - disse o Palhaço, com a confirmação de toda aquela gente.
Ela e o Palhaço fitaram-se. Silêncio. Depois de muito tempo, Ela disse:
- Faz algum tempo que estou aqui, e desde então não vi ainda o nascer de um novo dia.
- Estamos presos nesta noite, caríssima. O tempo já não existe para nós.
- Sinto muito.
- Sente muito? Mas isso é maravilhoso! O céu está sempre estrelado e a lua está sempre cheia! Viveremos assim para sempre! Nós escolhemos deste o nosso último momento.
- Entenda, meu caro. Estas estrelas de que falas estão tão longe que sequer posso senti-las. Quero antes a estrela que nos cega de tanta luz. Quero antes a estrela que a Lua nos esconde. Quero antes o Sol!
- Preferes o tempo?
- O tempo sempre foi o meu remédio. A eternidade, ah, a eternidade deve ser muito chata.
- Então siga o seu caminho.
- Mas para onde irei agora que já cheguei até aqui?
- Para o norte. Para o norte sempre.
Ela saiu do circo e sentou-se à espera do Sol. Tirou as meias porque resolveu que seguiria descalça agora. Queria sentir o Sol, e os pés no chão.
*Para meu pai, Peter, e para Átila, o huno.
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