Dê um tempo. Saia de manhã, vá pra Soares Lopes, ou uma rua qualquer da cidade. Ao passar pela praça, escute simpáticas palavras sobre seus olhos, de um quase conhecido. Pare pra comprar chocolate gelado. Caminhe sem tempo, sem documento, sol de verão, vento nos cabelos. Fique descalço, apesar de o chão estar quente. Veja alguém que você ama, e que tem vontade de conversar por muito tempo. Siga em frente. Escolha uma palavra. Sente-se no banco, e pense sobre ela por muito tempo. Ao concluir alguma coisa, levante-se e prossiga. Desperte olhares por ser tão incomum. Jogue o copo vazio no lixo. Não tema os maltrapilhos, nem o silêncio. Limpe o suor do rosto. Pare pra comprar bala de maçã, porque o sabor do chocolate já sumiu. Resolva que vai tomar uma decisão na sua vida; qualquer que seja. Pode ser, por exemplo, nunca mais pisar em formigas, ou nunca mais pronunciar uma certa palavra. Decisão tomada, não volte atrás. Quando achar que foi suficiente, volte pra casa. Mantenha a luz apagada, e evite o espelho, porque você pode acabar causando um incêndio, e alguém que você ama pode pular da janela da torre, e cair sobre os espinhos, e no fim ninguém vai entender mesmo, então não vai adiantar nada. Tome um banho gelado e demorado. Fale com alguém que você ama sobre alguma coisa banal. Olhe pela janela da torre e veja o quanto você é feliz. Termine bebendo água gelada. Eis aí um belo ritual.