Comer em prato raso não me deixa à vontade

A porta do meu quarto fica na direção da mesa da cozinha. Eu estava sentada lá, colocando remédio na cratera do meu joelho. Dali eu vi como tudo estava errado. Eles estavam errados, o copo estava no lugar errado, a comida estava errada, a pessoa usando o computador estava totalmente errada e a criança que corria pela casa estava apenas querendo atenção por ser tão carente.
Adoro crianças, mas naquele dia tudo estava tão errado que deixei de ser a menina alegre e passei a ser a garota sombria. Duas horas mais tarde eu teria que ir a um aniversário de uma criança, e lembrar disso me afetou irremediavelmente.
Quando a criança sedenta de atenção começou a enxer o saco eu devo ter olhado pra ela de um jeito tão intimidador que ela retribuiu com um olhar que me lembrou que ela era apenas uma criança. Crianças não têm culpa.
A vontade de expulsar aquela criança de casa, de gritar, de colocar o copo no lugar certo, de dizer que eu não ia a aniversário nenhum, de sumir, de falar tudo o que cada um deveria saber, de reclamar pela audácia, de jogar tudo na cara de todo mundo me consumia a ponto de eu simplesmente nem me importar mais com nada, não sorrir, não responder quando falavam e socar o meu joelho. O mesmo da cratera.
Tudo isso foi inconsciente. Estava tão mergulahda no meu caos que não sabia o que estava fazendo. Palavrões não resolveram. O que resolveu foi todos irem e me deixarem só. A solidão me ajuda a resolver várias coisas, mas afinal, o que resolve a solidão? A minha não tem cura. Sou só.